Tradução do Beatriz Cannabrava, Revista Diálogos do Sul
Pelas manhãs, Bertita e sua mãe racham lenha na casa dos vizinhos que contratam seus serviços, regularmente adultos mais velhos que ficaram sozinhos poque seus filhos foram para o Norte. Bertita de vinte anos amarra no chale a sua filha de um ano e a acomoda nas costas, seus outros dois filhos de cinco e de sete são os que se encarregam de acomodar a lenha para não deixar os montões espalhados.
Quando lhes vai bem logram que incluam almoço no pagamento. Umas tortilhas que molham no caldo de ervas, em um prato de feijões cozidos ou às vezes três tortilhas untadas com salsa. Já é lucro, têm algo para botar no estômago, quando o dia não é tão bondoso com elas esperam chegar em casas para ferver uma panelinha com água, umas gotas de azeite e uns grãos de sal, umas quantas tortilhas frias para depois tomar essa sopa. Sua economia não dá para mais.
Os filhos de Bertita estão desnutridos, também os de suas três irmãs, de quinze, dezessete e dezenove, que está a ponto de ficar sozinha como ela porque seus companheiros também querem ir para o Norte como a maioria de homens jovens do povoado aos que a pobreza e o esquecimento do governo, durante décadas, os obrigou a emigrar. O esposo de Bertita foi embora e não se soube nada dele, o último que se inteiraram foi que estava em Hermosillo, Sonora, aí perderam a comunicação, e isso já faz quatro anos.
Pelas tardes Bertita e sua mãe limpam terrenos para prepará-los para as semeaduras, com poucos homens no povoado as mulheres têm que se encarregar de criar os filhos e buscar sustento para eles, e também não abandonar a terra. Com o que vão juntando do pagamento de cada dia vão tirando para a comida, não têm luz elétrica nem água potável, uns vizinhos lhes dão água para suas necessidades básicas, mas a luz sai muito caro o pagamento se a compartilham, têm que iluminar-se com um candil. Suas necessidades vão fazer no mato.
Na hora do desjejum juntam todas as crianças, dez em total, e as sentam no chão ao redor do fogareiro, em copos plásticos lhes servem tortillas tostadas que despedaçam e fazem uma sopa com o café. Não há mais alimento que a massa tostada e um pouco de água amarela dos resíduos de café que fervem dia após dia até que perdem a cor.
Às vezes os vizinhos lhes regalam algumas espigas para que se ajudem com as tortilhas, dormem todos em uma casa de papelão e lâminas de três metros por quatro. Não há camas, o dono de uma farmácia lhes deu um tapete usado que tinha em sua casa, um caminhoneiro lhes regalou uma lona puída e colocam ambas sobre o chão para que não lhes transpasse o frio. Se acomodam como sardinhas enlatadas e assim passam a noite para suportar o frio.
Bertita sonha com seus filhos indo à escola, para que não sejam como ela, peregrinando, batendo nas portas das casas dos vizinhos perguntando por trabalho. Também quisera que a eles não caíssem tão logo os dentes como para ela, pelas cáries, é tão duro comer assim, qualquer coisa dura molesta as gengivas. Bertita sonha com seus filhos indo à escola e não fiquem analfabetos como sua mãe, suas irmãs e ela, para que no se vejam obrigados a emigrar, a abandonar sua terra, a esquecer seu idioma materno e o viver longe dos morros de Todos Santos Cuchumatán.
Mas são sonhos muito grandes, pensa, enquanto vai suando ao rachar os pedaços de lenha sob o sol abrasador do meio dia.
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Ilka Oliva-Corado @ilkaolivacorado