Feminicídio: Principal criminoso é o Estado com políticas que negam direitos às mulheres

Tradução do Beatriz Cannabrava, Revista Diálogos do Sul

É política de Estado em sociedade com governos neoliberais a violência contra a mulher e as massas empobrecidas e exploradas. Antes do braço armado está o recurso da religião que manipula emocionalmente os excluídos, mas que violenta duplamente as mulheres por seu gênero. Em nome da fé, amparados por religiões misóginas, muitos homens exercem a violência de gênero a tal grau que chega ao feminicídio. Isso não é novo, não estamos descobrindo a água com açúcar. Mas um estado ausente, infestado de corrupção, onde se propaga o machismo, a misoginia, a homofobia e se alimenta sistematicamente o patriarcado, é responsável da violência de gênero e todo o seu contexto.

Sem leis que castiguem quem violenta as mulheres em todas as suas formas, a violência de gênero continuará. E o principal criminoso é o Estado que com suas políticas nega o direito ao aborto, seguido de um planejamento minucioso de empobrecimento dos setores mais explorados. Negar o acesso à educação às meninas dos setores mais vulneráveis. Obrigá-las a parir manipulando a população com a ideia de que o aborto é um assassinato castigado por Deus, em lugar de informá-las sobre seus direitos, sem imiscuir-se em seus corpos. O aborto é um direito negado por Estados repressivos onde governam principalmente homens machistas que o utilizam como arma de castigo contra as mulheres por seu gênero. Mas se uma filha deles engravidar, a mandam abortar na melhor clínica do país ou no exterior e o mesmo acontece com as cúpulas da oligarquia.

Meninas sem acesso à educação, sem alimentação sadia, sem acesso a um sistema de saúde, vivendo em casas que não contam com a segurança mínima, em entornos violentos, sistematicamente orquestrados desde o Estado, são meninas que jamais terão um desenvolvimento integral e por isso tampouco serão mulheres realizadas, pessoal ou profissionalmente. O comum será vê-las sendo mães desde a adolescência por um abuso sexual, porque foi vítima do amor romântico tão patriarcal, ou porque foi casada à força, tudo mas menos uma pessoa feliz e realizada. Nenhuma mulher pode ser feliz nessas condições.

Como pode ser feliz uma menina com uma mãe que trabalha 16 horas em uma máquina, em uma fábrica, limpando um edifício, um hospital, queimando-se a vida em campos de cultivo? Uma mãe que sai de madrugada e regressa a altas horas da noite à qual lhe tiram a oportunidade de partilhar com seus filhos, de vê-los crescer, de abraçá-los, de repartir tempo de ócio com eles. Se ela mesma não teve nada disso, nessa corrente de abuso sistemático que é política de Estado.

Atitudes e ações de abuso contra a mulher se contam por milhares, não é preciso chegar aos golpes para que se conte como abuso, existe também o abuso emocional que prejudica da mesma forma. Mas em nossas sociedades a violência exercida desde o Estado nestas pós ditaduras também fez com que os homens abusem de meninas, adolescentes e mulheres em entornos familiares porque sabem principalmente que a vergonha é uma boa aliada e com tal de que da porta para fora não fiquem sabendo, eles podem fazer o que quiserem da porta para dentro. Porque segue sendo conselho sacerdotal ou do pastor da igreja, perdoar, guardar silêncio, manter a família unida à custa dos delitos que devem ser pagos com prisão, mas que se são exercidos contra uma mulher bem podem ser perdoados por Deus.

Assim é como vemos o aumento impressionante de abusos sexuais contra meninas por seus pais, avós, irmãos, primos; adolescentes grávidas abusadas dentro do próprio lar. Sabem que não existe lei que os castigue porque as políticas de Estado são as de repressão e violência contra a população. As do empobrecimento e exploração no trabalho porque quanto mais trabalhe, quanto mais cansada esteja uma pessoa, quando mais fome, menos força, menos tempo e energia para pensar; porque sem educação desconhecem seus direitos e se isso se emprega propositalmente por gênero é muito mais benéfico para um governo corrupto e criminoso ter meninas mães e infelizes que adolescentes a caminho da educação superior e seu desenvolvimento profissional. Sendo mães são incapazes de questionar por que a pobreza as obriga a buscar a comida a qualquer hora para seus filhos; em troca, se se desenvolvem profissionalmente têm acesso a outro nível de vida e exigem seus direitos e são questionadoras às políticas dos Estado.

Chegamos, como sociedade, a ultrapassar todos os limites, porque os ultrapassou também o Estado, e é por isso que um feminicídio não causa espanto, nem assombro, nem indignação, porque também deixou de surpreender que aterrizem aviões carregados de droga e que os queimem depois sem que se encontre os responsáveis. Porque deixou de surpreender que a própria polícia ou o exército custodiem os carregamentos. Porque deixou de surpreender que os próprios membros das forças de segurança sejam os que violem mulheres e não sejam castigados. Então diz um civil: se eles com uniforme violam porque não posso fazer eu com qualquer mulher, seja do meu entorno familiar ou não. Se o próprio presidente vê que matam mulheres e não se pronuncia é porque não lhe interessa, então qualquer um sabe que pode violentar a mulher que queira e não terá consequências.

Um crime desde o Estado é negar alimentação, saúde e educação às meninas, mas também é virar as costas quando as violentam por seu gênero, as golpeiam, as violam, as engravidam, as desaparecem e as assassinam. Quando sucede o mesmo com adolescentes e mulheres. Mas se um Estado não se pronuncia, esse governo deve ser trocado de imediato pela sociedade, então é o povo que deve reagir e levar ao poder gente capaz que entenda que é desde o Estado que se devem exercer as políticas que modifiquem a violência sistemática contra a mulher. Mas, que sociedade está disposta a fazer isso? Contra a violência de gênero vemos, no nível mundial, que são majoritariamente as mulheres que se pronunciam, porque os homens, sejam de que ideologia forem, são os mais beneficiados com a inexistência de leis que castiguem semelhante delito e aberração.

Pois serão as mulheres as que mudem as políticas de Estados que alimentam sistematicamente a violência de gênero.

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Ilka Oliva Corado @ilkaolivacorado

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