As vendedoras da aldeia: Tímidas, falam pouco, apenas o absolutamente necessário

Tradução do Beatriz Cannabrava, Revista Diálogos do Sul

Sempre vêm à minha mente quando as flores das dez começam a abrir suas pétalas nas manhãs tíbias de verão. E com a brisa tênue dos dias de sol e canícula, aparecem os baldes de água regando o pátio empoeirado daquela casinha que foi o ninho que abrigou a inocência da minha infância.

E o cheiro da terra molhada chega até a janela do meu quarto, aqui nesta terra longínqua onde hoje planto alhos, sementes de tomates e acomodo os ramos da erva cidreira que se expandem galantes como trepadeiras entre as flores, os vasos e meu pequeno terreno em minha cidade alugada. 

Aparecem entre a bruma fria dos últimos minutos do orvalho da alvorada, quando o calor começa a despontar para dar passagem ao meio-dia. Eu as vejo descer pela rua principal da aldeia, com seus chinelos empoeirados de tanto caminhar, com suas cestas na cabeça cheias de ervas, verduras e flores. Com queijo, creme, ovos de pata e galinha. São meninas e adolescentes que trabalham durante o dia para cuidar dos animais, moer milho na pedra, fazer as tortilhas, lavar a roupa, cuidar das plantações, estudar (algumas) e descer à Cidade Peronia, o bairro vizinho recém criado, para vender a colheita.

A imagem aparece em uma sequência de tempo, com a harmonia de seus passos equilibrando seus corpos que carregam as enormes cestas que branqueiam de flores de izotes, güisquiles maduros espinhosos e peruleros. Com raminhos de páscoas, véu de noiva, dálias e crisântemos. Medidas de nêsperas, limões frescos recém colhidos e goiabas de carne vermelha, galantes. 

As alfaces grandes que são plantadas nos terrenos que estão ao lado da casona do segundo tanque, que parece uma casa patronal de uma fazendona, sobressai entre as outras de adobe.

Com a loja ao centro, o balcão grande cheio de bandejas de pão, doces de rapadura com gergelim, de quatro por cinco bem postos em folhas verdes. E a geladeira na entrada com as águas frias e os refrescos de tamarindo. Os sacos de roscas, as espuminhas em pequenas cestas de vime e as tranças de cabeças de alho colocadas atrás da porta junto a uma ferradura de cavalo e um feixe de sete ervas para espantar as más vibrações.  Como pequenas fontes corre a água entre os sulcos de flores e verduras, as cenouras grandes e o coentro que espalha seu aroma até a aldeia do Calvário e Sorsoyá.

Elas são esperadas sempre como a água de maio em Peronia (um bairro que não tem ainda seu caráter e personalidade bem formados, mas que terá com os anos, devido à diversidade da origem de sua população), é suficiente que caminhem duas ou três quadras para que vendam o conteúdo de suas canastras. Depois descem ao mercado para comprar sal, açúcar, canela, azeite, velas, gás, retalhos de pano, as coisas que não podem produzir na aldeia. 

Não oferecem, não batem nas portas das casa, só caminham no meio da rua com suas cestas, com suas costas erguidas e seus grandes aventais. Bem asseadas, seus cabelos trançados, seus vestidos feitos pelas mulheres de sua família, tímidas, falam pouco, o absolutamente necessário para as vendas. Isso é suficiente para que se alvorocem as quadras e saiam as mulheres a comprar o que em um momento acaba. E ficam as pessoas com vontade de vê-las regressar com suas canastras cheias de beleza e essência da aldeia que em meus anos de infância foi o horizonte que deu liberdade às minhas asas de cigarra.

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Ilka Oliva Corado @ilkaolivacorado

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